Avaliação - JAC J2: Cortando um dobrado
Pequeno chinês é competente dentro de suas limitações
O JAC J2 é, no mínimo, simpático! Durante a experiência dupla que o Novidades Automotivas teve com o modelo, a reação geral das pessoas foi de curiosidade, acompanhada de comentários como “que carro bonitinho!” e “é mais legal do que eu esperava”. Isso fora as duas perguntas principais: “quanto custa?” e “é bom!?” Houve até quem presumisse se tratar de um carro elétrico…
Como apresentava no video de lançamento do J2 no Brasil, a JAC parece querer que o J2 se desdobre para agradar a diferentes perfis de compradores. Por um lado, oferece um carro “pop”, de dimensões bastante compactas e design simpático, além de bem equipado. Mas promete também um carro “rock”, de desempenho acima da média. E tudo por um preço acessível. Respondendo a primeira pergunta, o J2 custa R$ 31.990.
Para responder a segunda, também desdobramos o carrinho! Encaramos quase 1800 km de estradas entre São Paulo e Minas Gerais com uma unidade do J2 (carro branco), enquanto outra encarou quase 600 km no trânsito da cidade do Rio de Janeiro (carro vermelho).
As duas primeiras coisas que chamam atenção no J2 são tamanho e desenho. Linhas arredondadas predominam, tanto na carroceria quanto em detalhes como maçanetas e retrovisores. Os faróis têm forma de gota e as lanternas traseiras são enormes. O amplo para-brisas e os vidros laterais, mais curvados, fogem do que tem sido o comum na mesma faixa de preço. Os para-lamas dianteiros são bem destacados, enquanto um vinco ascendente corta a região inferior das portas e contorna as rodas traseiras. No conjunto, o J2 tem personalidade e agrada bem. Parece até menor do que é, mas não parece frágil.
Com 3,53 m de cumprimento, ele é 7 cm menor que um Kia Picanto – um carro de porte semelhante, mas mais refinado e bem mais caro. Se comparado a um Fiat Uno (mais próximo em termos de acabamento e preços), a diferença aumenta para 24 cm. Mas o J2 tem a mesma largura do Fiat, e ainda leva pequena vantagem na distancia entre-eixos (2,39 ante 2,37 m). Logo, na prática o espaço interno não é diferente do que se costuma encontrar em outros compactos. Na dianteira, aliás, tem-se a impressão de espaço maior – efeito do para-brisas amplo e avançado, que fica distante dos passageiros.
Quem realmente perdeu espaço foi o porta-malas - que nosso auxiliar nos obrigou a apelidar de porta-vergonha (a imagem explica). Não houve milagre: são apenas 121 litros (280 no Uno). Ao menos a abertura pode ser feita através de comando interno, pela chave ou pelo comando remoto da chave… Ou expontaneamente, já que a tampa traseira de um dos carros abria-se sozinha durante o movimento.
Por dentro
Embora apresente pequenas falhas, o acabamento interno tem boa aparência, com vários elementos circulares e detalhes cromados ou em padrão que imita fibra de carbono. Encontramos menos rebarbas e encaixes melhores do que em alguns modelos nacionais (mais caros, inclusive). O que incomoda é a aparente fragilidade de algumas peças plásticas, como as maçanetas internas e a alavanca de regulagem de encosto dos bancos.
Os instrumentos têm iluminação em um tom forte de azul arroxeado que sempre está acesa, e que cansa a vista durante a noite. Adotar regulagem da intensidade (dimmer), ou simplesmente reduzi-la, resolveria o problema. O velocímetro é grande e de fácil leitura, mas o mesmo não vale para o conta-giros, que é bastante reduzido – do mesmo tamanho do marcador de combustível. Não há computador de bordo.
Os bancos têm bom formato e densidade adequada da espuma. Contudo, após algum tempo, é a posição de dirigir que cansa: o assento é baixo e não possui regulagem de altura. Além disso, por causa da parede corta-fogo, que avança o interior para abrir espaço para o motor, os pedais estão mais próximos do motorista, enquanto o volante, ao contrário, fica mais distante. O resultado é uma posição muito vertical do encosto do banco, com quadril em posição baixa, pernas mais dobradas e braços mais esticados que o ideal – e isso foi constatado por motoristas com tipos físicos e alturas diferentes. A pequena regulagem de altura da coluna de direção (que move junto o quadro de instrumentos) até ajuda, mas não resolve o problema. Bastaria aproximar o volante do motorista e oferecer regulagem de altura para o banco para melhorar sensivelmente a posição ao dirigir (e não falta espaço acima da cabeça, então seria possível adotar uma regulagem ampla nesse sentido).
Ainda sobre os pedais, os três poderiam ter mais progressividade de acionamento. O da embreagem tem curso muito curto, enquanto o do freio é sensível no início da atuação e o acelerador tem pouca precisão – além de estar muito próximo do console central.
Algo que chama a atenção dos mais atentos é a ausência das saídas de ar-condicionado centrais, substituídas por uma saída no topo do painel, que termina jogando o ar diretamente no retrovisor interno. Tanto esta característica quanto a disposição geral dos elementos no painel lembram muito os trigêmeos Toyota Aygo, Citroën C1 e Peugeot 107 – nenhum deles esta disponível no Brasil. As saídas de ar laterais das duas unidades eram maleáveis a ponto de se fecharem sozinhas, até mesmo ao aumentar a velocidade do fluxo de ar. Tudo isso termina prejudicando a eficiência do ar-condicionado.
Um outro detalhe, que remete a carros franceses, é a má posição dos comandos dos vidros e retrovisores elétricos. Os primeiros estão na base do console e à frente do câmbio, e o segundo no encosto de braço, na porta, mas em posição muito recuada. São locais pouco práticos e o motorista acaba desviando sua atenção para acioná-los.
Em movimento
A suspensão se destaca por ser independente nas quatro rodas, que dá conta de absorver bem irregularidades do pavimento. Vale ressaltar que, bem diferente do que acontece com o J3, o J2 vendido por aqui não teve sua suspensão elevada. Entretanto, ela peca pela falta de batentes hidráulicos, comum a carros bem adaptados às condições brasileiras. A falta desta solução mecânica é acentuada pelo pequeno curso dos amortecedores, possivelmente resultante de pequenos amortecedores. Esta escolha técnica pode ser explicada pela necessidade de pequena intromissão no cofre do motor e no porta malas, mas o pequeno deslocamento de trabalho dos mesmos faz com que o batente superior seja sempre alcançado em lombadas e valetas, ao passo que o batente inferior sempre é atingido em juntas de dilatação de pontes, dotando o pequeno chinês de "superpoderes" uma vez que alguns “saltos” foram proporcionados em vias expressas, ao entrar e sair de pontes com certa variação de nível.
Ao contrário do que se poderia esperar, curso curto não inibe alguma inclinação da carroceria em curvas mais acentuadas. Junta-se a isso o pequeno entre-eixos (menor inércia polar, reações mais rápidas e cruas) e peso concentrado na dianteira (motor sobre o eixo) para que o compacto asiático agrade muito mais ao universitário que vai para a aula ouvindo pop do que ao engenheiro mecânico que dirige ao som de rock. Mas o J2 ainda consegue ser ágil e divertido de guiar. E não será em em compactos com motor 1.0 que "pilotos" ensimesmados, que prefiram imprimir tocadas mais picantes, irão encontrar muita emoção.
O motor 1.4 (que com 1332 cm³ é, em verdade, um 1.3) de 108 cavalos (6000 rpm) e 14,1 kgfm de torque (4500 rpm) se beneficia pelas dimensões compactas do carro e se seu peso, de 915 quilos (nem tão baixo para seu porte). O JAC J2 é bem esperto na cidade, principalmente trabalhando em giros mais elevados - especialmente entre 2500 e 5000 rpm. Em estrada, o desempenho também é bom, mas não parece compatível com os números divulgados pela JAC – velocidade máxima de 187 km/h e a aceleração de 0-100 km/h abaixo dos 10 segundos nos parecem números muito otimistas. Por outro lado, é possível manter tranquilamente velocidades de cruzeiro e, auxiliado pelo bom escalonamento do câmbio, viajar a 110 km/h com as rotações pouco acima de 3000 rpm.
O consumo se mostrou moderado, com médias de 10,5 e 14,5 km/l na cidade e na estrada, respectivamente, quase sempre com ar-condicionado ligado. Vale lembrar que o J2 só bebe gasolina. Um ponto onde o JAC pode – e deve – melhorar é no isolamento acústico. Em rotações mais altas o barulho do motor invade o interior, e um som constante de ressonância metálica (que lembra um diapasão) torna-se irritante. E aí, infelizmente não adianta apelar para o sistema de som. O aparelho fica devendo recursos básicos, como equalizador ou mera regulagem de graves e agudos, e também na qualidade de recepção (culpa da antena impressa no para-brisas) e na qualidade de reprodução – o som dos alto-falantes não é melhor que o de fones de ouvido baratos. Até há entrada USB, mas em formato mini, que condiciona seu uso à presença de um cabo adaptador.
No mercado
É verdade que, hoje, frente à nova lei que obriga todos os carros vendidos no país a contarem com airbags dianteiros e ABS, o argumento utilizado pelas marcas chinesas, de vender carros “completos”, deixou de ser tão apelativo. É possível encontrar modelos nacionais compactos dotados desses equipamentos de segurança, mais travas e vidros elétricos, ar-condicionado e direção hidráulica, na faixa de trinta e poucos mil reais.
Mas o J2 vai além na lista de equipamentos, oferecendo também rodas de liga leve, faróis de neblina, retrovisores elétricos, sensores de estacionamento, repetidores das setas nas laterais, regulagem de altura do volante... A lista de itens de série é mesmo longa. Mas, curiosamente, o carro não conta com limpador-lavador do vidro traseiro e regulagem de altura para o bando do motorista – duas coisas que fazem falta no dia-a-dia.
Embora seja inevitável pensar no Kia Picanto como um possível concorrente para o J2, o fato é que o coreano é um carro mais refinado e bem mais caro – oferecendo até opção de câmbio automático. Assim, talvez o modelo que mais se aproxime da proposta do J2 seja o também chinês Chery S18 – que custa exatamente o mesmo preço, tem motor 1.3 de 90 cv e lista de equipamentos tão farta quanto.
Mas, pensando em posicionamento no mercado, faz mais sentido comparar o J2 a configurações mais equipadas de compactos nacionais, que têm preços próximos ao do chinês e são mais expressivos em volumes de venda. De toda forma, o compacto já é o JAC mais vendido este ano, com 3.479 unidades até junho, contra 2.321 do J3
Conclusão
Na vida real, o pequeno JAC agrada se consideradas as limitações impostas por sua proposta urbana e pelo preço.Se a JAC acertasse pequenas falhas e reduzisse um pouco o valor cobrado, poderia ter nas lojas um produto imbatível.
Como está, o JAC J2 ainda oferece mais equipamentos e desempenho superior, se comparado a seus pares no segmento, além de garantia de 6 anos (5 anos a mais), por preço equivalente. Ele pode ser uma escolha acertada para quem quer algo diferente ou procura um modelo pequeno e ágil, mas bem equipado e acessível, para uso na cidade. Ou para o uso como o segundo (ou terceiro) carro da família.
Mas, diante dos compactos nacionais, que evoluíram em termos de equipamentos, e das pequenas falhas a resolver, o J2 precisa cortar um dobrado.
Com Henrique Rodriguez
Fotos | Henrique Rodriguez, Fábio Abreu e Fabio Perrotta